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42% das crianças e jovens de até 19 anos vivem em domicílios sem rede de esgoto adequada no Ceará

04/03/24

42% das crianças e jovens de até 19 anos vivem em domicílios sem rede de esgoto adequada no Ceará

Netinho Rodrigues

No Ceará, mais de 1 milhão de crianças e adolescentes vivem em domicílios sem acesso a sistema de esgotamento sanitário adequado. Essa quantidade corresponde a 42% da população de 0 a 19 anos do Estado residente em domicílios particulares permanentes ocupados. O levantamento foi feito pelo Diário do Nordeste a partir do Censo Demográfico 2022, cujos dados sobre características dos domicílios foram divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em fevereiro.

Entre essa parcela de jovens do Ceará que moram em locais sem acesso à rede adequada, a maioria (86%) utiliza fossa rudimentar ou buraco. Em números absolutos, esse grupo corresponde a 892.149 crianças e adolescentes.

​Por outro lado, 58% da população dessa idade tem acesso a sistema de esgotamento sanitário considerado adequado pelo Plano Nacional de Saneamento Básico. Isso inclui aqueles domicílios com acesso à “rede geral, rede pluvial ou fossa ligada à rede” ou com “fossa séptica ou fossa filtro não ligada à rede”.

​Pecentual de crianças e adolescentes do Ceará por acesso à rede geral de esgotamento sanitário no domicílio onde moram

​O levantamento feito pela reportagem também mostra que 17% (421,2 mil) dos jovens dessa faixa etária no Ceará vivem em domicílios sem ligação com a rede geral de distribuição de água e que 5% (121,7 mil crianças e adolescentes) vivem em domicílios sem água canalizada.

​Na publicação “As múltiplas dimensões da pobreza na infância e na adolescência no Brasil”, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) destaca a falta de acesso a serviços de saneamento básico — como água potável e tratamento de esgoto — causa impactos sociais, econômicos e ambientais "significativos", levando a privações em outros âmbitos.

​O documento do Unicef aponta a saúde como a dimensão mais diretamente afetada, levando a internações por doenças de veiculação hídrica e despesas anuais de aproximadamente R$ 55 milhões. Outra área citada é a educação, com reflexos na frequência e no atraso escolar.

​Publicado em 2023, o estudo mapeia as múltiplas dimensões da pobreza (alimentação, renda, educação, trabalho infantil, moradia, água, saneamento e informação) e categoriza as privações em intermediária (acesso ao direito de maneira limitada ou com má qualidade) e extrema (sem nenhum acesso ao direito).

​Em relação ao saneamento, a categorização é feita da seguinte forma:

​Sem privação: Criança e adolescente de 0 a 17 anos que vivem em lar com banheiro de uso exclusivo e fossa séptica ou descarga na rede coletora ou pluvial

Privação intermediária: Criança e adolescente de 0 a 17 anos que vivem em casa com banheiro compartilhado ou com fossa rudimentar

​Privação extrema: Criança e adolescente de 0 a 17 anos que vivem em casa sem banheiro ou com vala a céu aberto

​ABSOLUTA PRIORIDADE

No artigo 227, a Constituição Federal de 1988 determina que a família, a sociedade e o Estado têm o dever de assegurar os direitos das crianças e dos adolescentes com “absoluta prioridade”. “É o único lugar da nossa constituição que aparece esse termo”, afirma Ana Claudia Cifali, coordenadora jurídica do Instituto Alana, organização da sociedade civil que atua pelo direito de crianças e adolescentes.

​Nesse contexto, a advogada destaca o impacto que as experiências nessa etapa têm para o desenvolvimento dessas pessoas, com consequências que podem acompanhá-las pelo resto da vida. Com isso, as desigualdades sociais afetam a criança “nos seus múltiplos direitos”. “Nesse período da vida, a ausência de uma nutrição adequada, de saneamento básico vão afetar toda uma trajetória. Está relacionado ao crescimento, à melhor resposta imunológica a possíveis infecções”, exemplifica.

​Em relação à falta de acesso a saneamento básico adequado, Ana Claudia Cifali destaca o impacto na saúde da população ao citar a mortalidade infantil por diarreia. “Essa questão está muito relacionada ao rotavírus, responsável pela maior parte desses casos (e para o qual há vacina). Então, também tem uma questão de acesso à informação e da importância da imunização”, avalia.

​Para garantir os direitos das crianças e dos adolescentes, a advogada aponta a necessidade de se fazer “um bom diagnóstico” das principais necessidades de cada estado, município ou comunidade e garantir a destinação de orçamento para suprir essas demandas.

​Ela defende, ainda, a importância da participação popular e de as autoridades ouvirem quem vivencia as dificuldades no cotidiano. “É nos territórios que as pessoas sabem as necessidades mais urgentes. Esses dados do Censo ajudam a ter um direcionamento, mas cabe ao poder público dialogar com essas comunidades e traçar planos para superar esses problemas”, finaliza.

​RETRATO DOS DOMICÍLIOS

Os dados publicados pelo IBGE na última semana trazem informações relativas às características dos domicílios coletadas no Questionário Básico da pesquisa. Eles referem-se aos domicílios ocupados — aqueles com morador, uma vez que o questionário não foi aplicado nos domicílios vagos ou de uso ocasional.

​Além disso, as informações estão restritas aos domicílios particulares permanentes, que foram construídos a fim de servir exclusivamente para habitação e, na data de referência, tinha a finalidade de servir de moradia a uma ou mais pessoas.

No caso de domicílios particulares improvisados (sem dependências destinadas exclusivamente à moradia) e dos domicílios coletivos com morador (asilos, conventos e pensões, entre outros), as edições anteriores dos censos brasileiros aplicavam o questionário para a coleta de informações relativas aos moradores, mas não às características dos domicílios. Essa prática foi mantida no Censo 2022.

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