Brasil vai à COP30 com 15 milhões de nortistas sem coleta de esgoto e 6 milhões sem água tratada
10/06/25

RealTime1
Em meio ao discurso de sustentabilidade que ganha fôlego na preparação para a COP30, marcada para acontecer em Belém, o Brasil chega a 2025 sem resolver uma chaga que atravessa governos e planos nacionais: a ausência de saneamento básico na Região Norte.
Dados oficiais do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS 2024) mostram que 15 milhões de nortistas vivem sem coleta de esgoto e mais de 6,5 milhões ainda não têm acesso à água tratada. É o pior desempenho do país, disparado.
Segundo o Índice de Sustentabilidade da Limpeza Urbana (ISLU 2024), a Região Norte também figura com os piores indicadores em drenagem urbana, componente essencial do saneamento previsto em lei, mas sistematicamente negligenciado nas políticas federais.
“Estamos em 2025 e ainda falamos de quase 40% da população do Norte sem acesso à água tratada. Isso representa 6 milhões de pessoas”, alertou a diretora da Águas de Manaus, Andreia Hagstram.
“Apenas 14% das pessoas do Norte são atendidas com coleta e tratamento de esgoto. Esse dado é estarrecedor.”
Capital sem esgoto e chuva sem drenagem
Em capitais como Porto Velho, Macapá e Rio Branco, a rede de esgoto cobre menos de 20% da população. Em áreas ribeirinhas e bairros periféricos, o esgoto corre a céu aberto, misturado às águas das chuvas, sem nenhum tipo de tratamento ou controle urbano.
Mesmo Manaus, a maior cidade da região, que alcançou a universalização do abastecimento de água, ainda atende apenas 40% da população com coleta e tratamento de esgoto. Em plena capital da Amazônia, cenas de esgoto bruto sendo lançado nos igarapés ainda são comuns.
“A drenagem urbana ainda não é tratada por ninguém, mas é o maior desafio climático das cidades”, afirmou Andreia, ao criticar a ausência desse tema nos planos públicos.
Doenças, mortes e ausência de Estado
De acordo com o Trata Brasil, a falta de esgotamento sanitário foi responsável por 32 mil internações e 228 mortes no Norte em 2024, além de um custo superior a R$ 12 milhões aos cofres do SUS.
O impacto vai além da saúde: compromete a qualidade da água nos rios, ameaça o turismo, encarece a gestão pública e aumenta a desigualdade social urbana.
Em áreas de palafitas, por exemplo, o esgoto ainda cai diretamente sob as casas. Em uma dessas comunidades, o chamado Beco do Nonato, uma solução técnica isolada foi implementada com apoio da iniciativa privada. No entanto, sem uma política estruturante, esses projetos seguem sendo exceções, não regra.
Tarifa de R$ 10 revela o grau de exclusão
Em Manaus, a existência de uma tarifa emergencial de R$ 10 para acesso a água e esgoto expõe o limite da política tarifária social. O modelo foi criado para atender famílias que não conseguiam pagar nem a tarifa com desconto de 50%.
“Criamos a tarifa R$ 10 porque havia famílias que não conseguiam pagar nem a tarifa social. Isso mostra o tamanho da vulnerabilidade urbana”, declarou Andreia.
Sem resposta federal, COP30 pode ser vitrine do fracasso interno
A proximidade da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas da ONU, em Belém, coloca o Brasil sob os holofotes da política ambiental global. Mas os dados da própria máquina pública revelam que, antes de liderar pactos internacionais, o país precisa enfrentar o colapso estrutural da sua própria Amazônia urbana.
“Não é possível falar em justiça climática sem falar de saneamento. A Amazônia está sendo ignorada no básico”, concluiu Andreia.